Habermas escreve sobre Capitólio e emergências do jornalismo
Em artigo recente, Jürgen Habermas escreve “Reflexões e hipóteses sobre a transformação estrutural ulterior da esfera pública política”. Ele é autor de uma filosofia que serve a diferentes campos de pesquisa. Aos 93 anos, acrescenta a plataformização às considerações anteriores. Companheiro de grupo de pesquisa, Dr. Nilton Kleina brinca que, pela idade avançada do autor e ainda escrevendo artigos, “isso é precarização” — risos. Seja como for, o texto defende claramente, categoricamente, que as plataformas devem se responsabilizar pelos conteúdos nelas publicados. A discussão dá pano para manga, e ensaiamos os primeiros pontos da costura.
Habermas (2022) define uma “mídia tradicional” e uma “nova mídia”, basicamente, sendo a primeira responsável pelos conteúdos e com certo compromisso com a cognição e a estética, enquanto a segunda é marcada pela internet, pela fragmentação do palco público e pela plataformização. No cenário analisado por ele, a mídia impressa espera por cada vez menos leitores de jornais e revistas, desde o aparecimento da televisão. Ou seja, não é exatamente uma novidade que o impresso venha encolhendo a cada ano.
A internet e as plataformas concedem aos usuários possibilidades de publicarem o próprio conteúdo — idealmente sem censura prévia, e com igualdade de acesso. Esse anunciado já encontra adversidades práticas — por fatos amplamente conhecidos. Agora, algo pode nos incomodar mais.
Capitólio
Sob observação filosófica pelo menos desde 1962 (ano de lançamento de “Mudança estrutural”), Habermas agora vai à depredação do Capitólio. Ele argumenta que, embora os motivos aparentes sejam insuportáveis, o causo é produto de décadas de insatisfação do povo dos Estados Unidos com a política. Desconfiar de políticos e da imprensa também ocorre na Alemanha, e há efeitos similares em toda a Europa.
Por analogia, a crise no jornalismo (evitadores de notícias, menos publicidade, má fama) pode ser uma revolta, em resposta às palavras que exageramos, aos atos que não denunciamos, e às omissões cruéis que fizemos em nome do bem.
Público e anunciantes ficaram longes de nossas mesas de pauta, mas isso você também sabe. Longes o suficiente para entenderem que não precisam de nós, ou que de nós querem se vingar, tal qual um soberano imaterial que deixou de os servir. Eles podem, entretanto, querer-nos sem precisar-nos. De todo modo, para a audiência do broadcast, jornalistas e jornalismo não são inculpes.
É urgente para nós explicitar que políticos e jornalismo podem compartilhar do desgosto dos eleitores, mas o Estado banca a política, enquanto o jornalismo é atravessado por necessidades de mercado no mínimo desleais.
Arguimos que o jornalismo esteve e está pronto para produções editoriais (notícias, investigações, debates, opinião, documentários, etc) com valores basais de técnica e de formação humana. É preciso diferenciar: jornalismo é jornalismo, partido político é partido político.
Revisado por Tiago Borges.